24 de jan. de 2011

Aula 13 - Promoção da igualdade e valorização da diversidade: combate ao preconceito e a discriminação

Para falar de igualdade é importante pensar sobre a instituição das categorias para criação das diferenças e o uso políticos destas para o exercício do poder.
A diferença compreendida como constituidora da diversidade humana é bela, enriquece a vida humana e afirma cada ser na sua singularidade.
No entanto, a conversão das diferenças de gênero, raça / etnia, deficiência e orientação sexual, entre outras, em desigualdades são construções históricas geradas pela humanidade ao longo de sua história de uso do poder.
Voltando um pouco no tempo, temos que as ciências, nos últimos séculos, vão pensar e falar em torno de um sujeito abstrato e universal, como representação de toda a humanidade. Um sujeito nos moldes das propostas das verdades ocidentais – homem, adulto, branco, heterossexual e cristão.
Esse modelo passa a ser o centro de todos os discursos, filosóficos, religiosos, médicos, jurídicos, científicos etc., reafirmando-o. Nossa forma de pensar e de falar, ou seja, nossa linguagem e nosso imaginário, foram aos poucos construídos em torno desse centro, desse modelo universal de humano. Assim, o que não corresponde a ele, rapidamente foi conduzido à condição de “outro”, ou seja, desqualificado.
Nesse contexto, construiram-se categorias de sujeitos que, por estarem na condição de diferentes, encontram-se com menos direitos, como as mulheres, as(os) negras(os), homossexuais, as pessoas com deficiência, as pessoas que professam crenças distintas do cristianismo e as crianças, dentre outras.
Os movimentos sociais, como já mencionado anteriormente, foram importantíssimos para a mudança dessas relações, propondo reivindicação de espaços, reformulação de leis, igualdade de direitos. Exemplo desse tipo de ação são os movimentos feministas, movimento negro, o movimento pelos direitos das pessoas com deficiência, o movimento de lésbicas e de gays, o movimento pelos direitos das crianças, dos adolescentes, dos idosos e o movimento por um Estado laico. Estes tiveram importante papel para a transformação das concepções sobre o sujeito universal e trazendo esses ‘novos sujeitos’ para a luz do reconhecimento social.
A luta por direitos humanos trouxe, por um lado, uma série de conquistas destes direitos afirmados em nossa legislação. Entretanto, a conquista destes direitos na Lei não foi suficiente para alterar a realidade de discriminação e preconceito, construída historicamente e que encontra-se inserida na cultura e na mentalidade de nossa sociedade e presente no cotidiano de violações destes direitos.
Para efeito didático diferenciamos aqui preconceito e discriminação.
Podemos compreender discriminação no campo da desigualdade e, portanto, seu contraponto é a luta pela igualdade de direitos. Já o preconceito está no campo da intolerância, da dificuldade de conviver com o diferente e seu contraponto seria a afirmação da diversidade, o direito à diferença, com igualdade de direitos.
Preconceito é, tanto para as diversas linhas da sociologia e da psicologia, categoria cognitiva, é atitude, implica em emoções, sentimentos negativos ou de desconforto diante daquilo ou daqueles que são considerados diferentes. É relacionado aos valores, à tradição cultural e à construção de mentalidades. E, portanto, o seu combate exige outros tipos de iniciativas distintas, exige a construção de estratégias e ações que visem interferir nestes valores, implica em esferas diferentes de ação. Preconceito não necessariamente se manifesta em ação concreta, pode “estar guardado”, como questiona a campanha “onde você guarda o seu preconceito”. Mesmo com preconceito podemos agir de forma “politicamente correta”.
A discriminação é ação concreta que implica em tratamento que desconsidera as necessidades e especificidades dos sujeitos concretos. Para ações de discriminação a Lei prevê sanções, punições, obrigatoriedades. Eu não posso discriminar negros, mulheres, crianças, homossexuais ou deficientes porque são diferentes do sujeito construído historicamente “homem, branco, adulto, heterossexual, sem deficiência”. A lei proíbe qualquer tipo de discriminação e prevê mecanismos para coibi-las. Portanto, planejar o combate às discriminações exige ações concretas com amparo legal.
No entanto, o preconceito é abstrato, invisível, composto de valores e culturas. São valores que necessitam de ações específicas e coletivas para que se rompa com a visão de mundo baseada no preconceito e se construa uma cultura da convivência e respeito às diferenças.
Uma pessoa pode ter preconceito com relação a idosos e assim mesmo ceder seu lugar no ônibus, em função da pressão social ou de um imperativo legal.
Bem como uma instituição pode não ter preconceito com relação a pessoas com necessidades especiais e simplesmente construir uma escola sem condições de acessibilidade para cadeirantes aos banheiros, como acontece em inúmeras escolas em que há rampas de acesso para as salas, mas não é possível acesso aos banheiros. É necessário agir legalmente diante de ações discriminatórias e de ações coletivas que interfiram nas concepções e valores das pessoas.
Isto é, para alcançar eficiência na luta por igualdade de direitos e valorização da diversidade humana, os conselhos devem considerar a necessidade de ações distintas e estratégias diferenciadas. O combate a discriminação exige medida legal, enquanto o combate ao preconceito exige ações no campo da educação, da cultura, da mudança de valores.
O mesmo é similar para as instituições. Nesse sentido, mesmo que a organização política e burocrática das instituições não seja preconceituosa (pois não têm capacidade cognitiva), pode possuir mecanismos internos de discriminação. Basta citar diversos exemplos em que isso ocorre. Como a manutenção de crianças negras durante mais tempo nas primeiras séries do ensino fundamental. Condições sanitárias mais precárias, onde vivem crianças negras e pobres, se comparada com crianças brancas com as mesmas condições financeiras. São ainda mais distintas se comparadas com crianças brancas e ricas.
As últimas décadas do século XX foram marcadas por grandes mobilizações de todos os segmentos mais atingidos pelo preconceito e discriminação. A bandeira da igualdade e o reconhecimento da diversidade como direito foi a principal pauta introduzida pelo conjunto destes movimentos que conquistaram, já na Constituição de 1988, a inclusão de alguns artigos para a garantia desses direitos e criação de mecanismos de exigibilidade e de deliberação e controle de políticas de promoção dos direitos.
A criação dos conselhos temáticos dos direitos e de políticas sociais, como por exemplo o CNDC – Conselho Nacional de Combate à Discriminação, o CNPIR – Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, o CNDM – Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, é resultado também da pressão dos movimentos por igualdade de direitos e combate à discriminação. O Conanda, em 2005, colocou pela primeira vez na pauta da conferência nacional o tema específico da igualdade e diversidade. Isto significou que todo o país foi convidado a discutir os direitos de crianças e adolescentes, considerando o direito à diferença.
Assim, a ação dos conselheiros deve ser nos dois sentidos. Diante de um preconceito praticado pelos indivíduos, ou na prática discriminatória das instituições,tem que agir legalmente.
A violência contra os fóruns e/ou focos de diversidades leva a necessidade de atenção especial face às práticas de violência como a violência domestica, a homofobia, pois estas situações demandam ações de promoção, proteção e defesa que promovam/valorizem a igualdade e ao mesmo tempo mantenham e reconheçam as diversidades. As violações contra os direitos humanos geram necessidades de programas de defesa de direitos, e serviços como delegacias especializados, programas que respeitem as diferenças diante das violações, como Brasil sem Homofobia, as Casa Abrigo, os Centro de Referência, entre outros.
Uma sociedade democrática, justa e humanitária pressupõe o respeito a todas as pessoas e a garantia de direitos, independente de sexo, cor, idade, condições físicas e mentais e orientação sexual. Esta é uma disposição de nossa Lei maior, desde 1988. Cabe aos conselhos promoverem a discussão na sociedade, estimulando a transformação da mentalidade antiga para estes novos conceitos e visão de homens e mulheres, combatendo as desigualdades e valorizando a diversidade humana, onde todas as cores são fundamentais.

Autoria: Maria de Lourdes Alves Rodrigues
Colaboração: Maria de Nazaré Tavares Zenaide, Célia Maria Escanfella e Maria Célia Orlato Selem
Fonte: Curso de Formação de Conselheiros em Direitos Humanos (Abril a Julho/2006), realização de Ágere Cooperação em Advocacy, com apoio da Secretaria Especial dos Direitos Humanos/PR. É permitida a reprodução integral ou parcial deste material, desde que seja citada a fonte.

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