26 de jan. de 2011

Aula 15 - Construção de Redes de Proteção dos Direitos

Conceito de Rede
A palavra Rede é antiga e vem do latim retis que significa teia, ou seja, um entrelaçamento de fios que formam uma espécie de tecido de malha aberto. O termo vem ganhando novos significados, especialmente nas últimas décadas do século XX, com as novas tecnologias, o incremento da informática e a internet. O significado adotado neste texto refere-se ao conjunto de pessoas ou organizações que mantêm contato entre si com um fim comum. Descrito no manual de Redes Sociais do Centro de Direitos Humanos, “redes são sistemas organizacionais capazes de reunir indivíduos e instituições, de forma democrática e participativa, em torno de causas afins”.
Tão importante como definir é entender as Redes “como uma proposta democrática de realização do trabalho coletivo e de circulação do fluxo de informações, elementos essenciais para o processo cotidiano de transformação social.”
São espaços coletivos por excelência. Não é possível uma rede estabelecer-se com propósitos individuais. Não se faz uma rede sozinho. Mas a vontade e participação de cada integrante individualmente garante a vitalidade e dinâmica das Redes. Seu alimento é a circulação de informações, o compartilhamento de saberes, experiências e objetivos comuns. Sua forma de existir pode ser virtual (redes eletrônicas) ou presencial (redes físicas), sendo que um funcionamento mais eficaz pressupõe a articulação entre estas duas possibilidades.
Os pressupostos do trabalho em Rede são a participação, a cooperação, a horizontalidade, a circulação de informações e a articulação, sejam elas sistemáticas, estratégicas ou pontuais. São eficazes quanto maior for a capacidade de cooperação e compartilhamento de informações.
A estrutura horizontal de uma Rede contribui para “romper o modelo de organização tradicional, piramidal, centralizador, competitivo4, de poder hierárquico e de representação, possibilitando vivenciar nas relações sociais e políticas as idéias e princípios emancipatórios, de empoderamento de pessoas e organizações”. As redes possibilitam uma nova experiência de convívio político, próprio da horizontalidade, da descentralização e da desconcentração do poder. “Participar verdadeiramente de uma rede implica em aceitar o desafio de rever as formas autoritárias de comportamento as quais estamos acostumados e que reproduzimos (como dominadores e como subordinados) apesar dos discursos e intenções democratizantes”.
Para que sejam eficazes, as Redes devem contar com pessoas ou organizações que garantam sua sustentabilidade no método, mantendo a horizontalidade, incentivando a cooperação e promovendo a articulação. Pessoas que sejam preparadas, formadas para manter o fluxo contínuo de informações, comunicações, de debates e decisões sobre as ações estratégicas coletivas com vistas a alcançar os objetivos declarados pelos integrantes da Rede.
Considerando que Redes são processos horizontais, com foco numa determinada causa ou objetivo, os Conselhos dos Direitos podem usar este método de trabalho articulado em rede para potencializar o resultado das ações na perspectiva da garantia dos direitos dos segmentos alvo do conselho.
Existem diversas modalidades de organização em Rede, com diferentes objetivos. Por exemplo: redes de proteção, redes de organizações da sociedade civil, as redes governamentais, redes de serviços, redes de defesa dos direitos, e também as redes de violações de direitos. Sobre estas últimas, ressalta-se que é preciso conhecê-las para melhor enfrentar o problema, Exemplo disso são as redes de pedofilia e pornografia infantil que se constituem basicamente de forma horizontal, com uma dinâmica de intensa troca de informações e de cooperação, tanto para obter seus produtos quanto para continuar na clandestinidade , utilizando-se da rede de computadores para isso.

Exemplos concretos de ações em Rede com foco na garantia dos direitos

1. A Rede de combate a exploração sexual de crianças e adolescentes articula Governo Federal, governos estaduais e municipais, conselhos dos direitos e tutelares, Ministério Público, Judiciário, Legislativos, organizações da sociedade civil, entre outros.
O combate à exploração sexual de crianças e adolescentes requer um grande esforço coletivo de trabalho em rede, visando a eficiência das ações, o cessar da violência, a investigação dos acusados e a proteção das vítimas. Na outra ponta, dos agressores, também identifica-se a constituição de redes de exploração, as redes de violações dos direitos, opostas à proteção. A Rede de combate à exploração sexual, ou redes de proteção de crianças e adolescentes vítimas da exploração e abuso sexual, surgem como resposta ao enfrentamento do problema, considerando sua complexidade e o necessário envolvimento de diversos atores sociais, do executivo, judiciário, legislativo e da sociedade civil organizada, como os/as juízes/as, promotores/as, delegados/as, defensores de direitos, conselheiros dos direitos, conselheiros tutelares, as universidades, centros de pesquisa, as organizações governamentais e não governamentais de atendimento, servidores públicos, os fóruns e centros de defesa dos direitos, entre outros. Conta com um serviço de recepção e encaminhamento nacional da denúncia, o disque-denúncia 0800. Ao realizar o I Seminário Nacional do Disque-Denúncia verificou-se a necessidade de potencializar as ações em rede, definindo melhor seu fluxo e alinhando os conceitos e categorias utilizados na política de enfrentamento à violência e exploração sexual de crianças e adolescentes.
2. Rede Saci ( http://www.saci.org.br/) - É uma rede eletrônica que atua como facilitadora da comunicação e da difusão de informações sobre deficiência, visando a estimular a inclusão social e digital, a melhoria da qualidade de vida e o exercício da cidadania das pessoas com deficiência.
3. Campanha Nacional de Combate à Pedofilia - Tendo como principal meio de divulgação a Internet, a pedofilia movimenta milhões de dólares por ano e expõe milhares de crianças indefesas a abusos que nem mesmo adultos suportariam... Para se ter uma idéia, hoje, existem Clubes de Pedofilia! Esses “Clubes” servem para “associar” pedófilos pelo mundo; onde estes podem adquirir Fotos ou Vídeos contendo Pornografia Infantil ou, pior, “contratar” serviços de Exploradores Sexuais, fazer Turismo sexual ou mesmo efetivar o Tráfico de menores e aliciá-los para práticas de abusos sexuais. E, pasmem, este circo de horrores é responsável pelo desaparecimento de crianças no mundo inteiro.
4. Rede Jovens - A Rede Jovens Brasil luta pela garantia dos Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, da Saúde Sexual e Reprodutiva e da Educação em Sexualidade para as brasileiras e brasileiros jovens. Integra articulações e espaços de controle social, decisões políticas, nacionais e internacionais, na área dos Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos e Juventude como na Área Técnica de Saúde Adolescente e Jovem (ASAJ), no Fórum Social Mundial (FSM), Fórum Social Mundial de Saúde (FSMS), Jornadas Brasileiras pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro, Comissão da Secretaria de Juventude, Comitê organizador do 10º EFLAC e Conselho Nacional de Juventude.
5. Rede de Atenção à Criança e ao Adolescente de Caxias do Sul (RS)

O que é a Rede?
A Rede de Atenção à Criança e ao Adolescente de Caxias do Sul é um conjunto de entidades governamentais, não governamentais, conselhos setoriais e dos direitos e poder judiciário que trabalham de forma integrada, visando atender crianças, adolescentes e suas famílias.
Quais são os objetivos da Rede?
Os objetivos da Rede de Atenção à Criança e ao Adolescente de Caxias do Sul são facilitar, agilizar, viabilizar, propor e dinamizar ações nas diversas áreas de atenção à criança, ao adolescente e suas famílias (abrigos, centros educativos, saúde mental, drogadição, portadores de necessidades especiais, maus-tratos, apoio sócio-familiar). Essas ações são realizadas de forma integrada, abrangendo todo o município.
Como a Rede se organiza?
As entidades, através de seus representantes, se reúnem periodicamente a fim de pensar e planejar ações alternativas para o atendimento. Com fins de orientar o funcionamento da Rede, em novembro de 2004 foi aprovado seu Regimento Interno.
Histórico da Rede
No ano de 1995, em discussões proporcionadas pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente - Comdica, algumas entidades começaram a perceber que estavam vivenciando situações semelhantes no seu dia-a-dia: situações de rua, de abrigamentos e outras que sempre envolviam o uso de drogas. Entendeu-se, então, que essas entidades - FAS, Juizado da Infância e Juventude, Promotoria da Infância e Juventude, INSS, Patna, Cruz Vermelha, UCS, SESI e UAB - deveriam se reunir, através de representantes, para discutir alternativas para as situações comuns com as quais se deparavam, principalmente com o uso de drogas.
A idéia era trabalhar na área da prevenção ao uso de drogas. Atualmente a Rede, sob a liderança do Conselho dos Direitos da Criança, articula projetos culturais, de atendimento em arte e educação e de capacitação conjunta das entidades da Rede.
Rede On line
A Rede Eletrônica foi iniciada em 2000 e hoje o site está no ar (www.recria.org.br). A rede eletrônica tem a função de subsidiar a formulação e implementação das políticas públicas desenvolvidas na área. Visa criar um cadastro de todos os usuários da Rede, com informações cumulativas dos atendimentos prestados por qualquer das entidades envolvidas. A dificuldade existe na medida em que as organizações não têm familiaridade com informática e muitas vezes não há pessoas disponíveis para esta aprendizagem.
Fonte: Fundação Telefônica – Programa Pró-Direitos (www.risolidaria.org.br).
6. Rede Participativa
É um projeto desenvolvido em rede por organização da sociedade civil (Associação de Apoio ao Trabalho Cultural, Histórico e Ambiental – APÔITCHÁ) e escola Municipal.
Palco de muitas epidemias causadas pela contaminação do solo e da água pelo lixo, a cidade de Lucena foi alvo de um diagnóstico da realidade local, realizado pela organização APÔITCHÁ. Com a colaboração de organizações, entidades e a comunidade da região, por meio de um Fórum do Lixo e um Seminário de Mobilização Comunitária, foi constituída a Rede Participativa, um projeto que envolveu vários atores em torno do objetivo de proporcionar atendimento integral às crianças e adolescentes submetidas à degradação da qualidade de vida imposta pelo contexto no qual estão inseridas. Crianças, adolescentes e jovens recebem aulas de oficina de linguagem e podem contar com uma sala de leitura, palco para teatro de bonecos, brinquedoteca e empréstimos de livros e brinquedos. Junto à organização, a escola faz o planejamento e avaliação do projeto, complementação nas ações, desenvolvimento de atividades na escola e o Programa de Formação Continuada.
Para que as Redes funcionem e alcancem resultados se faz: conhecer o tema referente a causa focalizada; elaborar um plano estratégico, definir e priorizar as ações de advocacy, desenvolver e utilizar ferramentas de comunicação, definir uma agenda de encontros e eventos para seus integrantes, organização de grupos de trabalho focado nos assuntos de interesse de seus participantes, na causa e nos objetivos que se quer alcançar. Enfim, aproveitar todas as oportunidades de colaboração que significam sinergias, troca de banco de dados, de informações e articulação de ações.
Em se tratando de espaços de promoção, proteção, defesa e controle social para que direitos sejam assegurados, as redes neste caso não podem ter como estratégia a competição, mas a cooperação, a solidariedade, a complementação, a parceria.
Dicas para a Articulação de Redes
A articulação de uma rede pode dar ênfase a:
  • Incentivos a articulações regionais: estas articulações podem render bons frutos, pois organizações de uma mesma região tendem a ter problemas similares e por estarem geograficamente próximas têm maiores possibilidades de realizarem reuniões presenciais.
  • Encontros presenciais: estes encontros reforçam os elos de confiança da rede e a tornam mais propícia a comunicação e trabalho conjunto. Embora nem sempre todos os integrantes de uma rede possam comparecer a reuniões presenciais, as comunicações aumentam significantemente após os encontros. Se houver tecnologia disponível, é interessante transmitir estes encontros via Internet para toda a rede e ainda estimular a participação on-line.
  • Construção de um informativo: o objetivo é manter os participantes atentos às ações da rede. A tônica deste tipo de comunicação pode ser bastante informal e algumas notícias podem ser de caráter corriqueiro e por vezes jocoso, para fortalecer outros tipos de vínculos entre os participantes.
Sugestão de atividade:
Busque no seu Estado ou no seu Município, exemplos de ações em Rede de proteção dos direitos ou de combate à violações
  • das mulheres
  • dos direitos humanos
  • dos direitos de Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros
  • da igualdade racial, dos negros/as, índios/as
  • dos direitos da pessoa idosa.
Referências bibliográficas:
CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida, Ed. Cultrix: São Paulo-SP, 1996.
CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede. A era da informação: economia, sociedade e cultura, vol. 1. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
FACHINELLI ,Ana Cristina, MARCON Christian e MOINET, Nicolas. A prática da gestão de redes: uma necessidade estratégica da Sociedade da Informação. Rede Brasil de Comunicação Cidadã [on-line] Disponível em: http://www.rbc.org.br/.
STAMPS, Jeffrey. Redes de Informações, São Paulo: Makron Books, 1994.
TORO, Jose Bernardo e Duarte, Nísia Maria. Mobilização Social: um modo de construir a democracia e a participação.
Links interessantes:
Risolidaria/Fundação Telefônica (www.ridesolidaria.org.br) – seção Trabalhando em Rede
Rits - Rede de Informações para o Terceiro Setor (www.rits.org.br)
Centro de Direitos Humanos (www.cdh.org.br)
Fórum Brasil Orçamento (http://www.fbo.org.br/)
Campanha Nacional de Combate à Pedofilia
Rede Jovens Brasil
Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
Autoria: Maria de Lourdes Alves Rodrigues
Colaboração: Kátia Chagas
Fonte: Curso de Formação de Conselheiros em Direitos Humanos (Abril a Julho/2006), realização de Ágere Cooperação em Advocacy, com apoio da Secretaria Especial dos Direitos Humanos/PR. É permitida a reprodução integral ou parcial deste material, desde que seja citada a fonte.

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